Depois que Alexandre, o Grande, devastou o Oriente Próximo, constituindo seu gigantesco Império, o grego tornou-se a língua dominante. No século III a.C. uma tradução grega das Escrituras Judaicas foi empreendida, e ficou conhecida como Septuaginta. Todos os livros das Escrituras Judaicas foram incluídos na Septuaginta, além de vários livros que seriam mais tarde excluídos do cânon protestante – a coleção autorizada de escritos sagrados – que foram denominados de livros apócrifos.
No século IV o latim havia substituído o grego como língua oficial do Império Romano, e surgiu então a necessidade de se ter uma Bíblia em latim. Um monge italiano de nome Jerônimo aceitou o desafio e produziu a tradução que se tornou conhecida com Vulgata, porque foi escrita em latim vulgar. Jerônimo traduziu a maior parte do Antigo Testamento a partir dos antigos textos hebraicos, em vez de trabalhar a partir da versão grega da Septuaginta, que tinha sido usada pelos cristãos desde o princípio. A Vulgata foi publicada cerca de 400 d.C., poucos anos depois de Teodósio I ter feito do cristianismo a religião oficial do Império Romano, no ano 391, e tornou-se a versão dominante no cristianismo da Idade Média.
Durante a Idade Média a tradução, sobretudo do Antigo Testamento, foi desencorajada. O papa Inocêncio III, em 1199, proibiu versões da Bíblia sem autorização, como uma reação contra as heresias do Catarismo e dos Valdenses, e os sínodos de Toulouse e de Tarragona (1234) proibiram a posse de tais escritos.
William Tyndale, nascido em 1484 e morto em 1536, foi um acadêmico e sacerdote inglês formado mestre em Artes na Universidade de Oxford, que traduziu a Bíblia para uma versão inicial do moderno inglês. Contemporâneo e amigo de Lutero, muitos o colocam como pré-reformador, mas é inegável que ele teve uma grande participação de maneira direta na Reforma Protestante.
Tyndale nasceu em um local próximo à fronteira do país de Gales. Foi criado desde sua infância na Universidade de Oxford, onde, por sua longa permanência, cresceu tanto no conhecimento dos idiomas e das outras artes liberais, como na prática das Escrituras, às quais a sua mente estava muito apegada.
Estudando as Escrituras, começou a defender as teses da Reforma Protestante, muitas das quais eram consideradas heréticas, primeiro pela Igreja Católica e depois pela própria Igreja Anglicana. Aos 30 anos fez uma promessa que haveria de traduzir a Bíblia diretamente dos originais para o inglês, com o objetivo de que todo o povo – desde o camponês até os nobres da corte real – pudessem ler e compreender as Escrituras em sua própria língua. Mas em 1523 Tyndale teve negado seu pedido de permissão para traduzir a Bíblia para o inglês, porque seu bispo católico associou tal atividade com o protestantismo emergente. Obstinado, Tyndale partiu para a Alemanha, onde traduziu todo o Novo Testamento e partes do Antigo, para o inglês.
Certa ocasião Tyndale estava por acaso conversando com um amigo a respeito de várias questões da Escritura, quando este disse-lhe: “Você sabia que o Papa é o próprio Anticristo de quem falam as Escrituras? Mas cuidado com o que você diz. Pois, se perceberem que você tem formada esta opinião, o fato vai lhe custar a vida”. Tempos depois, conversando e discutindo com outro teólogo, Tyndale mencionou esta questão, e seu interlocutor explodiu dizendo: “melhor seria para nós não ter as leis de Deus do que não ter as leis do Papa”. Ouvindo aquilo, Tyndale cheio de santo zelo, replicou: “Eu desafio o Papa e todas as suas leis. E acrescentou que se Deus lhe desse vida, dentro de uns poucos anos ele faria até um menino que ara a terra ter mais conhecimento sobre as Escrituras do que ele”.
O ressentimento dos padres contra Tyndale foi crescendo cada vez mais. Fugindo da Inglaterra, Tyndale partiu para a Alemanha onde se encontrou com Lutero. Inflamado de carinho e zelo pelo seu país, não recusou nenhum trabalho ou esforço para, de todas as maneiras possíveis, conduzir seus irmãos e compatriotas da Inglaterra ao mesmo gosto e entendimento da Palavra de Deus e da verdade com que o Senhor o revestira, e que não havia melhor caminho para isso do que franquear a todo o povo a leitura da Bíblia. Ele percebeu que não era possível conduzir os leitores a qualquer verdade, a menos que as Escrituras fossem colocadas diante de seus olhos de forma clara em sua língua materna, para que pudessem compreender o significado do texto. Considerava que todo o mal no seio da Igreja provinha em grande medida do fato de as Escrituras não serem expostas aos olhos do povo, por isso traduzir a Escritura para sua língua materna, em benefício do povo simples do seu país, passou a ser sua prioridade. Começou pelo Novo Testamento, cuja tradução já estava completa em 1525, sendo impresso e publicado por volta de 1529. A tradução do Novo Testamento de Tyndale – revista em 1534, 1535 e 1536 – e sua tradução do Pentateuco e do livro de Jonas, foram recebidas com pesadas sanções devidas à acusação feita pela Igreja institucional de que Tyndale tinha “mudado” a Bíblia enquanto a traduzia. O Bispo de Londres e o Chanceler inglês Thomas More, sentindo-se profundamente ofendidos, buscavam formas de destruir aquela tradução, que eles chamavam de falsa e errônea, ao que ele respondeu escrevendo: “Peço a Deus que registre, para o dia em que deveremos comparecer perante o Senhor Jesus, que nunca alterei uma sílaba da Palavra de Deus contra a minha consciência. Tampouco o faria hoje, nem para ter em troca tudo o que existe na Terra, seja honra, prazer ou riqueza”.
Não obstante toda a oposição e as calúnias proferidas, em pouco tempo mais de seis mil cópias estavam nas mãos do povo, o que gerou uma grande perseguição da igreja romana contra Tyndale em toda a Europa. No fim ele foi covardemente traído por uma pessoa que, tendo conquistado sua amizade, entregou-o às autoridades, e em maio de 1535 foi preso e levado para Bruxelas. Um ano depois saiu a sua condenação como herege pelo tom protestante de suas notas bíblicas. Seus amigos se mobilizaram, fizeram um apelo às autoridades e ofereceram-lhe um advogado e um procurador, mas ele recusou o oferecimento, afirmando que faria sua própria defesa. De tal modo pregava ele aos guardas encarregados de sua custódia e àqueles que vinham conversar com ele no castelo onde estava preso, que dele diziam que se esse não era um bom cristão, eles não sabiam quem poderia ser considerado como tal. No fim ele foi condenado em virtude de um decreto do imperador, e as traduções de Tyndale foram banidas pelas autoridades.
No dia seis de outubro de 1536, sob a instigação de agentes de Henrique VIII e da Igreja Anglicana, foi levado ao lugar da execução em Vilvoorden, localizada 10 quilômetros a nordeste de Bruxelas. Trazido para o local da execução, foi amarrado à estaca, estrangulado pelo carrasco e em seguida consumido pelo fogo; na estaca, orou com fervoroso zelo, em alto e bom som, e suas últimas palavras foram, “Senhor, abra os olhos do rei da Inglaterra“.
Fontes: redes sociais e o “Livro dos Mártires”.