outubro 2021

A DEPRESSÃO DE ELIAS

A depressão é o distúrbio psiquiátrico mais comum da atualidade, e estima-se haver mais de 350 milhões de pacientes depressivos no mundo, ou seja, quase 5% da população do planeta, sendo que o Brasil é o País da América Latina com mais pessoas ansiosas e estressadas. A venda de antidepressivos e estabilizadores de humor teve um aumento expressivo com a pandemia durante o ano passado, e segundo o Conselho Federal de Farmácia, quase 100 milhões de caixas de medicamentos controlados foram vendidos em todo o ano de 2020 – um salto de 17% na comparação com os 12 meses anteriores.

 

O deprimido reduz sua visão da vida ao pessimismo, derrotismo e autodepreciação. Embora capaz de fazer quase tudo normalmente, em boa parte do tempo sente-se fraco, angustiado, apático, manifestando sentimentos de culpa, irritabilidade, medo e desesperança. Num tempo em que pouco se conhecia sobre a depressão, que era então chamada de melancolia, Abraham Lincoln afirmou convicto que “A maioria das pessoas será feliz na medida em que decidir sê-lo”, o que a evolução da ciência médica acabou provando que não era verdade.

 

É inevitável para o ser humano ter tristeza – até mesmo Jesus se entristecia – mas há uma grande diferença entre ficar eventualmente triste e viver em contínua depressão, cultivando um estado de prostração permanente e profundo. E embora seja um fato difícil de aceitar, a depressão afetou até mesmo profetas de Deus, como Elias, sem dúvida um profeta heroico, basta lembrar de tudo o que enfrentou em sua firme oposição aos cruéis tiranos Acabe e Jezabel, obedecendo às ordens do Senhor.

 

Era também um homem que se destacava pela humildade, mas era um homem como nós, como Tiago 5.17 ressalta dizendo que “Elias era homem semelhante a nós, sujeito aos mesmos sentimentos…”. Paradoxalmente, após a mais esmagadora vitória que obteve em toda a sua vida, – relatada no livro de 1 Reis 18.19-40, – Elias sentiu-se desmotivado, desanimado, deprimido, no fundo do poço. Quando estudamos as Escrituras, verificamos que estes sentimentos não foram exclusivos de Elias, e que também outros homens de Deus considerados bem-sucedidos estiveram em determinados momentos de suas vidas acometidos dos mesmos sentimentos.

 

Deus não esconde nem ignora a fraqueza e a fragilidade de Seus servos. Certa vez Moisés ficou tão triste e desmotivado que pediu a Deus para tirar-lhe a vida (Êxodo 32.21); Jonas, após o grande reavivamento de Nínive, fez o mesmo (Jonas 4.3); Davi, “o homem segundo o coração de Deus”, também passou por várias crises de depressão, como quando pecou com Bate-Seba e tentou esconder o seu erro, entrando então na profunda aflição relatada no Salmo 32.3-4: “Enquanto calei os meus pecados, envelheceram os meus ossos pelos meus constantes gemidos todo o dia. Porque a tua mão pesava dia e noite sobre mim, e o meu vigor se tornou em sequidão de estio”; também Paulo, em certo ponto de seu ministério na Ásia, ficou desesperado “… até da própria vida”, como ele próprio relata em 2 Coríntios 1.8.

 

Voltando a Elias, o rei Acabe, totalmente dominado por sua perversa esposa Jezabel, contou-lhe como o profeta de Deus havia exterminado os profetas de Baal, o que provocou a reação de profunda ira da rainha em 1 Reis 19.2: “Então, Jezabel mandou um mensageiro a Elias a dizer-lhe: Façam-me os deuses como lhes aprouver se amanhã a estas horas não fizer eu à tua vida como fizeste a cada um deles.”

 

Então o heroico profeta, o último homem que imaginaríamos iria se dobrar ante aquela mulher ímpia e diabólica, tomou uma atitude inconcebível, narrada nos versos 3 e 4: “Temendo, pois, Elias, levantou-se, e, para salvar sua vida, se foi, e chegou a Berseba, que pertence a Judá; e ali deixou o seu moço. Ele mesmo, porém, se foi ao deserto, caminho de um dia, e veio, e se assentou debaixo de um zimbro; e pediu para si a morte e disse: Basta; toma agora, ó SENHOR, a minha alma, pois não sou melhor do que meus pais.”

 

Por quê ele fez isto? Por medo de Jezabel? Mas não era ele um homem de Deus, por Ele comissionado, que conhecia o poder do Senhor, que já havia orado a Ele e sido atendido de forma extraordinária em suas petições, e que mesmo sem ter orado era provido por Deus de todas as suas necessidades? Que mudança radical de atitude! Lembremos que as circunstâncias em que vivia Israel no capítulo 18, eram terríveis, em total afastamento de Deus, a idolatria, em especial o culto a Baal, grassava pelo país, e os reis Acabe e Jezabel, eram maus e corruptos até a medula.

 

Naquele clima de degradação espiritual a única oposição que se ouvia era a voz solitária de Elias, bravo arauto de Deus contra a perversidade do casal real. O profeta então, por ordem do Senhor, foi ousadamente ao rei propondo um desafio singular em que enfrentaria da seguine maneira os 450 profetas de Baal para mostrar quem era o verdadeiro Deus: seriam preparados novilhos para dois sacrifícios, um a ser feito por Elias e outro pelos profetas de Baal, e o deus que por meio do fogo consumisse um dos sacrifícios, estaria provando que era o autêntico Deus.

 

Os profetas de Baal clamaram, dançaram, se auto-flagelaram desde a manhã até o meio-dia sem que nada acontecesse, enquanto Elias, dando uma demonstração de confiança no agir poderoso do seu Deus, zombava deles. Então o profeta cavou uma vala em torno do altar de pedra que havia construído em nome do Senhor, colocou sobre ele a lenha, sobre esta o novilho em pedaços, e encharcou tão abundantemente o sacrifício, a lenha e o altar, que a água, escorrendo, encheu toda a vala.

 

A seguir o profeta clamou ao Senhor, e em 1 Reis 18.38 (NTLH) lemos que “Então o SENHOR mandou fogo. E o fogo queimou o sacrifício, a lenha, as pedras, a terra e ainda secou a água que estava na valeta.” Essa demonstração do poder incontestável do verdadeiro Deus convenceu o povo que, prostrado, rosto em terra, O adorou, dizendo no verso 39: “O SENHOR é Deus! O SENHOR é Deus!”.

 

Na sequência Elias mata todos os profetas de Baal, exterminando-os como a uma praga que contaminava mortalmente toda a população de Israel. Surpreendentemente, no entanto, se no capítulo 18 Elias era forte, corajoso, intrépido, um vitorioso guerreiro do Senhor, a seguir, no capítulo 19, de forma inesperada, inimaginável, torna-se débil, desencorajado, vivendo em pânico e terror, de forma semelhante a outros grandes heróis da fé, que tinham comunhão estreita com o Senhor, e a quem Ele havia comissionado direta e pessoalmente, mas que eventualmente oscilavam entre momentos de humana exultação e depressão.

 

Elias naquela circunstância conflitante – após a retumbante vitória sobre o mal que dominava Israel, porém tendo recebido a ameaça da rainha – já agora não estava mais pensando de modo claro e realista. Sua visão estava deturpada pelo medo e ele não percebia que a ameaça que recebia não vinha de Deus, mas sim de um simples ser humano, carnal e ímpio. Se tivesse feito uma avaliação correta do contexto que vivia e tido a fé que em outros momentos demonstrara, perceberia que Deus é quem estava no controle e não Jezabel, e continuaria confiando nEle como fizera durante tanto tempo.

 

Além do mais, Elias tomou a pior decisão pela qual poderia ter optado naquela circunstância, afastando-se de um relacionamento encorajador que poderia ser um decisivo apoio a ele, quando em 19.3 “… deixou seu moço”, confirmando a tese de que pessoas desencorajadas são solitárias e via de regra buscam o isolamento. Elias, naquele momento deveria ter ficado junto a alguém que lhe injetasse coragem, confiança, força e objetividade para enfrentar a difícil conjuntura. Alguém que lhe lembrasse: “Elias, o nosso Deus é muito mais poderoso que Jezabel. E Ele está contigo!”

 

Elias tinha sido colhido pela contracorrente da grande vitória obtida, o que muitas vezes acontece conosco: são momentos em que ficamos vulneráveis, especialmente quando a vitória resulta de uma experiência com Deus. Paulo apropriadamente em 2 Coríntios 12.10 declarou esse paradoxo: “… quando sou fraco, então, é que sou forte”, ou seja, nas circunstâncias em que nos sentimos fortes é então que somos perigosamente fracos! É mais ou menos como se sente o alpinista ao conseguir chegar ao alto pico de uma montanha, quando o entusiasmo é enorme, indescritível, a adrenalina está transbordando; porém, depois vem o grande desafio de descer a montanha, quando ele vai estar menos excitado, menos alerta, e assim mais relaxado e vulnerável aos riscos, como estava Elias após a batalha no Monte Carmelo.

 

Elias estava também a esta altura exausto fisicamente e esgotado emocionalmente, após ter vivido por vários anos no limite de suas condições, caçado pelo rei como insurgente, procurado como o inimigo público número um do seu reino, o que certamente muito enfraqueceu sua vida espiritual.

 

E, no verso 4, revelando o profundo estado depressivo em que se encontrava, “… se foi ao deserto, caminho de um dia, e veio, e se assentou debaixo de um zimbro; e pediu para si a morte e disse: Basta; toma agora, ó SENHOR, a minha alma, pois não sou melhor do que meus pais”. Assim afundado na autocomiseração, desejando a morte, foi quando Deus agiu poderosa e misericordiosamente, sem sermão, sem acusação, sem repreensão, permitindo apenas que Elias tivesse um momento de descanso e refrigério.

 

Mas o Senhor ainda fez mais, e falou a Elias com sabedoria, perguntando em 1 Reis 19.9: “…Que fazes aqui, Elias?“ E o profeta, em resposta, choraminga no verso 10: “… Tenho sido zeloso pelo SENHOR, Deus dos Exércitos, porque os filhos de Israel deixaram a tua aliança, derribaram os teus altares e mataram os teus profetas à espada; e eu fiquei só, e procuram tirar-me a vida.”

 

Então Deus, nos versos 11 e 12 pacientemente responde, orientando-o para que mantivesse seus olhos nEle, lembrando-o de que Ele estava ali por sua causa, para encorajá-lo e protegê-lo: “Disse-lhe Deus: Sai e põe-te neste monte perante o SENHOR. Eis que passava o SENHOR; e um grande e forte vento fendia os montes e despedaçava as penhas diante do SENHOR, porém o SENHOR não estava no vento; depois do vento, um terremoto, mas o SENHOR não estava no terremoto; depois do terremoto, um fogo, mas o SENHOR não estava no fogo; e, depois do fogo, um cicio tranqüilo e suave.”

 

Deus não estava no vento, nem no terremoto, nem no fogo, mas a Sua voz se fez ouvir como um sussurro, como uma brisa suave que teve o poder de retirar Elias do interior da caverna da desmotivação, da autopiedade e da depressão. Então, nos versos 15-18, o Senhor mostra a Elias que seu trabalho ainda não havia terminado, e que, apesar do seu cansaço e depressão, Deus ainda contava com seu profeta.

 

E, maravilha das maravilhas, nos versos 19-21 a Palavra nos conta que Deus providenciou para Elias um amigo: “Partiu, pois, Elias dali e achou a Eliseu, filho de Safate, (…) e seguiu a Elias, e o servia.” A compaixão de Deus não tem limites: o Senhor gentilmente o fez sair do fundo do poço onde o alimentara, dera-lhe descanso, refrigério e sábios conselhos, fazendo com que o profeta se sentisse novamente participante útil dos Seus soberanos propósitos!

 

Deus não nos fez para vivermos como ermitões solitários em nossas cavernas, mas sim para que vivamos em comunhão uns com os outros como partes do Corpo de Cristo, sustentando-nos e encorajando-nos mutuamente. Fomos criados e chamados para fazer parte da vida uns dos outros, não para nos isolarmos, concentrando-nos em nós mesmos, pensando como nossa vida é difícil, e como os outros são injustos.

 

Elias nos mostra que devemos sempre olhar para o alto: buscando o Senhor que nos liberta da depressão; agradecendo a Ele por permitir que tenhamos descanso e refrigério; falando ao nosso coração, apesar da autopiedade que possamos estar sentindo; concedendo-nos a companhia de um amigo que nos compreenda e encoraje; permitindo-nos discernir que o doador de tudo é muito mais importante do que as coisas doadas.

 

Senhor Deus de Elias, Deus nosso e Pai nosso, permita que nunca desviemos de Ti o foco de nossa vida. Que por mais que as circunstâncias que nos cercam sejam opressoras, que por mais que as trevas nos envolvam, jamais deixemos de confiar em Ti e no controle que Tens sobre a nossa existência. Que nosso referencial de fé seja sempre Habacuque 3.17-19: “Ainda que a figueira não floresça, nem haja fruto na vide; o produto da oliveira minta, e os campos não produzam mantimento; as ovelhas sejam arrebatadas do aprisco, e nos currais não haja gado, todavia, eu me alegro no SENHOR, exulto no Deus da minha salvação. O SENHOR Deus é a minha fortaleza, e faz os meus pés como os da corça, e me faz andar altaneiramente.” Em nome de Jesus. Amém.

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EGOS CONTRARIADOS

“… Senhor, queres que mandemos descer fogo do céu para os consumir? Jesus, porém, voltando-se os repreendeu e disse: (…) o Filho do Homem não veio para destruir as almas dos homens, mas para salvá-las. E seguiram para outra aldeia.” Lucas 9.54-56 (ARA)

 

 

Sabendo que a volta para o Pai se aproximava, Jesus decidiu ir com os discípulos para Jerusalém, e em meio à viagem, nas proximidades de uma aldeia samaritana, enviou alguns do grupo em busca de alojamento, mas os samaritanos repeliram-nos. Tiago e João acharam que esta rejeição merecia o aniquilamento sumário dos autores, porém Jesus censurou-os e levou-os a outra aldeia. Se hoje formos contestados em nossa vontade, sentindo nosso ego contrariado, não nos iremos ou tenhamos atitudes drásticas, mas façamos o que Jesus fez, simplesmente contornando mansamente o obstáculo e seguindo em frente!

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ANTES VÍTIMA QUE ALGOZ

“Mas eu lhes digo: não se vinguem dos que fazem mal a vocês. Se alguém lhe der um tapa na cara, vire o outro lado para ele bater também.” Mateus 5.39 (NTLH)

 

 

O seguidor de Jesus Cristo deve ter em mente que – seja qual for a circunstância – é preferível ser vítima que algoz, e nesta passagem nosso Senhor nos ensina a lei da não-resistência dizendo que mesmo que alguém profira contra nós os insultos mais ferinos, não devemos retrucar no mesmo nível, não sentirmo-nos ultrajados, nem termos desejo de vingança. Que neste dia estejamos permanentemente conscientes de que somos cristãos, e como tal não podemos ter nosso foco existencial exclusivamente em nossos direitos, mas sim em nossos deveres; nunca em nossos privilégios, mas sempre em nossas responsabilidades.

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