AMAR OS INIMIGOS

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AMAR OS INIMIGOS

Vivemos em um mundo em que cada vez mais se observa a prevalência do ódio nos relacionamentos entre nações, entre raças, entre ricos e pobres, entre pessoas de uma mesma família, entre cônjuges, entre amigos, entre vizinhos, entre conhecidos e desconhecidos. Já no século passado, a famosa filósofa alemã Hannah Arendt, filósofa alemã de origem judaica, dizia: “Vivemos tempos sombrios, onde as piores pessoas perderam o medo e as melhores a esperança.” É uma condição irremediável, cuja piora constante é irreversível, ou há esperança para uma vida na terra como Deus programou quando a criou, plena de amor, de paz e harmonia?

 

Lembramos então da ordenança de Jesus que está na passagem do Evangelho de Lucas 6.27-38 sobre o amor – a arma secreta de Deus – que devemos cultivar até pelos nossos piores inimigos, uma das armas mais poderosas para evangelizar o mundo. E nenhum outro mandamento de Jesus tem provocado tantas discussões e debates quanto esse em que Ele afirma: “Digo-vos, porém, a vós outros que me ouvis: amai os vossos inimigos, fazei o bem aos que vos odeiam; bendizei aos que vos maldizem, orai pelos que vos caluniam. Ao que te bate numa face, oferece-lhe também a outra; e, ao que tirar a tua capa, deixa-o levar também a túnica; dá a todo o que te pede; e, se alguém levar o que é teu, não entres em demanda. Como quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles. Se amais os que vos amam, qual é a vossa recompensa? Porque até os pecadores amam aos que os amam. Se fizerdes o bem aos que vos fazem o bem, qual é a vossa recompensa? Até os pecadores fazem isso. E, se emprestais àqueles de quem esperais receber, qual é a vossa recompensa? Também os pecadores emprestam aos pecadores, para receberem outro tanto. Amai, porém, os vossos inimigos, fazei o bem e emprestai, sem esperar nenhuma paga; será grande o vosso galardão, e sereis filhos do Altíssimo. Pois ele é benigno até para com os ingratos e maus. Sede misericordiosos, como também é misericordioso vosso Pai. Não julgueis e não sereis julgados; não condeneis e não sereis condenados; perdoai e sereis perdoados; dai, e dar-se-vos-á; boa medida, recalcada, sacudida, transbordante, generosamente vos darão; porque com a medida com que tiverdes medido vos medirão também”.

 

É impossível amar os nossos inimigos como amamos os nossos entes queridos, contudo, não importa o que alguém nos faça, mesmo que nos maltrate, insulte ou injurie, devemos procurar o seu bem, e jamais o seu mal. O amor pelos nossos é algo que não podemos apagar, mas o amor por nossos inimigos não deve brotar somente do nosso coração, e sim da nossa vontade, que só pode ser mobilizada pela graça de Cristo.

 

A ética cristã é eminentemente positiva, pois não se baseia apenas em não fazer coisas, mas, sim, fundamentalmente em fazê-las, por isso Jesus nos ordenou a fazer aos outros aquilo que gostaríamos que fizessem a nós mesmos:  amar aos que nos odeiam, fazer o bem aos que nos causam o mal, abençoar os que nos amaldiçoam e rogar a Deus pelos que falam mal de nós; se agredidos em uma face, devemos oferecer também a outra; a quem nos tomar o casaco entregar também a camisa, dando sempre a outrem o que nos for pedido, e quando nos for subtraída alguma coisa, não protestemos.

 

Fazer aos outros aquilo que desejaríamos que fosse feito a nós deve ser a premissa basilar da nossa vida, pois, se amamos só os que nos amam, que mérito há nisso? Afinal, até os piores criminosos amam os que os amam. E se emprestamos esperando receber de volta, o que estaremos fazendo de digno? Ímpios também emprestam para ímpios, esperando receber devolução. Ajamos, portanto, na contramão da mundanidade, amando nossos inimigos, fazendo sempre o bem a eles, e então o Senhor nos recompensará e seremos Seus filhos. Porque Ele é bom até com os ingratos e maus, tenhamos misericórdia dos outros, assim como Ele tem de nós. Não julguemos e condenemos para não sermos também julgados e condenados, perdoemos e Ele nos perdoará. Demos aos outros o que precisam e Ele nos dará o que carecemos, com uma generosidade tão grande que não conseguiremos conter tantas bênçãos em nossas mãos, pois a mesma medida que usarmos para medir os outros Ele também usará para medir a nós.

 

E qual a razão para termos na vida uma conduta cristã? É para nos fazermos mais parecidos com Deus, embora a uma distância abissal, intransponível dEle, mas é dessa forma que Ele age, enviando chuva sobre justos e injustos, Seu amor envolve tanto o pecador quanto o justo, tanto aquele que O ama e obedece quanto o que desdenha dEle, e esse é o sublime amor que precisamos imitar.

 

Por isso Ele nos ensina em Mateus 5.43-48, no Sermão do Monte: “Ouvistes que foi dito: Amarás o teu próximo e odiarás o teu inimigo. Eu, porém, vos digo: amai os vossos inimigos e orai pelos que vos perseguem; para que vos torneis filhos do vosso Pai celeste, porque ele faz nascer o seu sol sobre maus e bons e vir chuvas sobre justos e injustos. Porque, se amardes os que vos amam, que recompensa tendes? Não fazem os publicanos também o mesmo? E, se saudardes somente os vossos irmãos, que fazeis de mais? Não fazem os gentios também o mesmo? Portanto, sede vós perfeitos como perfeito é o vosso Pai celeste”.

 

Porém, Ele nunca ordenou que amássemos os nossos inimigos da mesma forma que amamos nossos seres amados, o que seria não só impossível como incorreto, pois tratam-se de formas diferentes de amor. Aqueles que nos são muito próximos em razão de parentesco ou de outro tipo de relação próxima, constituindo-se no grupo dos nossos amados, não poderíamos deixar de amar, é uma experiência que nos sobrevém sem que a busquemos ou produzamos, constituindo-se no plano de nossos afetos mais profundos. No caso dos nossos inimigos, o amor a eles não é apenas algo que brota do coração, e sim da vontade, constituindo-se em uma decisão pessoal que supera sentimentos naturais de rejeição, e muitas vezes até de ódio. É o amor ágape que possibilita amar a quem não gosta de nós e de quem também não gostamos, o que só Jesus pode promover em nós ao capacitar-nos a superar a nossa tendência natural para a ira e o ressentimento, fazendo prevalecer inquebrantáveis amor e misericórdia para com todos.

 

Mas, assim como um pai ama verdadeiramente seu filho não permitindo que faça tudo o que quer, e sim aquilo que deve fazer porque é correto e bom, embora tenhamos boa vontade para com determinada pessoa, não significa que concordemos com tudo o que faz. É nosso dever agir para que seja uma pessoa melhor, sempre visando a sua cura e muitas vezes protegendo-a de si própria, para isso tomando todas as medidas cabíveis que se façam necessárias, sempre amando-a com amor ágape, e antes de mais nada entregando tudo nas mãos do Senhor e rogando por Sua orientação em nossa conduta.

 

E não devemos esquecer que apenas o verdadeiro cristão pode obedecer a este mandamento, pois só pela graça de Jesus alguém pode ser transformado, abrindo-se então para experimentar “… qual seja a boa, agradável e perfeita vontade de Deus”, como Paulo diz em Romanos 12.2, uma vez que somente quando Cristo vive em nosso coração desaparece todo ressentimento e floresce todo o amor.

 

E, o mais importante de tudo: ninguém consegue orar por outro ser humano e ao mesmo tempo odiá-lo, porque quando nos apresentamos perante o Senhor junto de alguém por quem nos sentimos tentados a ter uma aversão intensa, algo acontece em nosso coração e somos impedidos de manifestar ódio por ele. Por isso a forma mais segura de eliminar qualquer ressentimento ou rancor é orar pela pessoa, por mais odiosa que seja, porque Jesus nos ordenou que tenhamos amor cristão, essa benevolência indescritível, essa invencível boa vontade por quem nos faz mal. E por que isso? A razão é incrivelmente simples: por que um amor assim faz com que o homem aja como Deus, manifestando um amor de suprema misericórdia que faz com que o sol se levante sobre bons e maus e Ele envie a chuva sobre justos e injustos.

 

Amado Pai Nosso, apesar de vivermos em um mundo em que o amor ágape, o amor de benevolência invencível, de infinita boa vontade, encontra-se tão escasso, capacita-nos a viver neste mundo como Tu planejaste e desejas que o façamos. Que aprendamos a não nos importar com o que as pessoas possam cometer ou nos fazer, que não nos queixemos pela maneira como somos tratados, se somos injuriados e ofendidos, e nunca permitamos que nos invada o coração outro sentimento que não seja a melhor e mais elevada boa vontade que sempre nos motive a agir com uma manifestação de afeto que busca, em toda e qualquer situação, o bem do outro. É assim que oramos no nome santo, precioso e único de Jesus, Aquele que deseja que aprendamos a agir como Ele em tudo. Amém.

 

 

 

 

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