Bom Senso ou Sabedoria?
Conta uma antiga lenda judaica que um rabino, ao ser procurado por um discípulo que lhe disse estar se dedicando ao estudo da sabedoria grega, disse: “Meu filho, nossa missão é meditar de dia e de noite na Palavra de Deus. Se quer estudar qualquer outra coisa, faça-o num tempo que não seja nem de dia nem de noite!” A suposta sabedoria do mundo, no entanto, ao longo das eras tem atraído como um ímã a muitas pessoas, e hoje em dia até a muitos crentes, que a consideram a máxima expressão do que chamam de “bom senso”, olvidando a insuperável sabedoria que emana da Palavra de Deus.
Segundo o dicionário Houaiss – que obviamente expressa conceitos humanos – bom senso é a capacidade ou poder de distinguir o verdadeiro do falso, o bom do mau, o bem do mal; julgamento correto e equilibrado, enquanto que sabedoria é a qualidade, caráter de quem ou do que é sábio, grande instrução; ciência, erudição, saber, acúmulo de conhecimentos; justo conhecimento das verdades, temperança, reflexão, sensatez, discernimento inspirado nas coisas sobrenaturais e humanas.
Mas segundo a Bíblia, sabedoria é muito mais que mero bom senso, é a forma de encarar a vida sob o enfoque, a orientação e o controle de Deus, e assim discernir as decisões corretas a tomar, sempre segundo a perspectiva divina e na busca de fazer a Sua vontade. Podemos então afirmar que o bom senso é humano, terreal, enquanto que a legítima sabedoria é divina, provém de Deus, e sem margem a qualquer dúvida, é absoluta e totalmente sensata em todos os seus aspectos.
Quando o rei Davi, em 1 Crônicas 21.1-4, 7-8, decidiu fazer o censo do povo, contrariando o conselho de Joabe, seu comandante do exército – estava demonstrando que confiava no número de soldados e não em Deus, o que, embora não fosse uma atitude intrinsecamente errada, até podendo parecer sensata pela ótica humana – na verdade tinha por trás a ação traiçoeira de satanás, que induziu-o a assumir uma postura divorciada e contrária à vontade do Senhor: “Então, Satanás se levantou contra Israel e incitou a Davi a levantar o censo de Israel. Disse Davi a Joabe e aos chefes do povo: Ide, levantai o censo de Israel, desde Berseba até Dã; e trazei-me a apuração para que eu saiba o seu número. Então, disse Joabe: Multiplique o Senhor, teu Deus, a este povo cem vezes mais; porventura, ó rei, meu senhor, não são todos servos de meu senhor? Por que requer isso o meu senhor? Por que trazer, assim, culpa sobre Israel? Porém a palavra do rei prevaleceu contra Joabe; pelo que saiu Joabe e percorreu todo o Israel; então, voltou para Jerusalém. (…) Tudo isto desagradou a Deus, pelo que feriu a Israel. Então, disse Davi a Deus: Muito pequei em fazer tal coisa; porém, agora, peço-te que perdoes a iniqüidade de teu servo, porque procedi mui loucamente.” Davi estava à primeria vista usando de bom senso, pois que general não precisa antecipadamente saber com que efetivo pode contar para ir à guerra? No entanto, não estava sendo sábio, pois o sábio confia no poder de Deus e sabe que a verdadeira sabedoria – que não é humana – provém do alto, como Salomão escreveu em Provérbios 2.6-7: “Porque o Senhor dá a sabedoria, e da sua boca vem a inteligência e o entendimento. Ele reserva a verdadeira sabedoria para os retos; é escudo para os que caminham na sinceridade”, e em Eclesiastes 2.26, “Porque Deus dá sabedoria, conhecimento e prazer ao homem que lhe agrada”.
Quando Jonas resolveu fugir de Deus para não ir a Nínive pregar aos ninivitas para que se arrependessem de seus pecados – desta forma desobedecendo frontalmente ao Senhor – pelo enfoque humano estava usando de “bom senso”, afinal o povo da cidade já havia matado vários outros profetas que Deus havia enviado, e ele por certo não desejava ser mais uma vítima. Mas estava deixando de lado a sabedoria da obediência ao Deus que diz em Isaias 55.8-9, “Porque os meus pensamentos não são os vossos pensamentos, nem os vossos caminhos, os meus caminhos, diz o Senhor, porque, assim como os céus são mais altos do que a terra, assim são os meus caminhos mais altos do que os vossos caminhos, e os meus pensamentos, mais altos do que os vossos pensamentos.”
E Gideão, o chamado “herói sem disposição”, com apenas 300 israelitas ao seu lado, seguramente não usou de “bom senso” ao decidir enfrentar os 135.000 midianitas, obedecendo à orientação de Deus e confiando nEle, como está registrado em Juízes 7.7: “Então, disse o Senhor a Gideão: Com estes trezentos homens que lamberam a água eu vos livrarei, e entregarei os midianitas nas tuas mãos; pelo que a outra gente toda que se retire, cada um para o seu lugar.”
Hoje em dia algumas pessoas dizem que antes de tomar qualquer decisão precipitada que implique seguir decididamente a Cristo – seja obedecendo ao Ide, seja empreendendo ousadamente algo na obra de Deus que os tire da sua “zona de conforto” – é preciso ter “bom senso”. É claro que é indispensável saber distinguir entre o certo e o errado, entre o verdadeiro e o falso, entre um impulso humano e um chamado divino, mas temos que dar um passo adiante nesta questão, sempre orando e ouvindo o que Deus tem a nos dizer a respeito. É claro também que – se nossa vida está entregue nas mãos de Deus – o Espírito Santo estará falando aos nossos corações e mostrando-nos a Sua soberana vontade quando é preciso tomar o que seria para o mundo uma “louca” decisão. Por isso é preciso ouvir, urge estar atento ao Seu falar, não permitindo que as coisas da carne se interponham nesta comunicação sublime! Quando o pequeno Davi – certamente instado pelo Espírito Santo – tomou a corajosa decisão de enfrentar desarmado o temível gigante Golias fortemente munido de armas, o “bom senso” não estaria com o rei Saul, que tentou dissuadi-lo de tal “loucura”, dizendo em 1 Samuel 17.33, “…Contra o filisteu não poderás ir para pelejar com ele; pois tu és ainda moço, e ele, guerreiro desde a sua mocidade”? Quando a rainha Ester decidiu ir em defesa do seu povo, os judeus, que estavam para ser trucidados, enfrentando o rei Assuero e a morte quase certa, estaria ela usando de “bom senso”? E as histórias de Abraão, de Moisés, de João Batista, dos 11 discípulos de Cristo – apenas para citar alguns dos muitos exemplos bíblicos – poderiam ser consideradas exemplos de “bom senso” ou de sabedoria e obediência a Deus?
O pastor Francis Chan em seu ótimo livro “Louco Amor”, diz que “Não é a dúvida científica, o ateísmo, o panteísmo ou o agnosticismo que, em nossos dias e na terra, têm mais chance de extinguir a luz do Evangelho. É essa prosperidade orgulhosa, sensual, do egoísta e arrogante, de gente que vai à igreja, mas tem o coração vazio”. Mais adiante ele diz: “…a igreja é um lugar difícil para se sentir à vontade quando uma pessoa deseja colocar o cristianismo do Novo Testamento em prática. Os objetivos deste cristianismo costumam ser um bom casamento, filhos muito comportados e uma boa freqüência na igreja. Levar as palavras de Cristo a sério é coisa rara. Isso é para os ‘radicais’ que estão ‘fora de sintonia’ e ‘passam dos limites’. A maioria de nós deseja uma vida segura, equilibrada para que possa ser controlada e que não envolva sofrimento. (…) Pessoas mornas tendem a escolher o que é popular e desprezar o que é certo quando estão em conflito. Elas desejam viver bem tanto dentro quanto fora da igreja; se preocupam mais com o que o povo pensa sobre o que elas fazem (como ir à igreja e entregar o dízimo) do que o que Deus pensa de seu coração e sua vida.”
Pai Celeste, sabendo que não há sabedoria sem bom senso, que nosso suposto bom senso jamais se sobreponha à sabedoria que vem da Tua Palavra e do agir do Teu Santo Espírito em nossas vidas. Dá-nos o discernimento, a força, a coragem, a ousadia, de obedecer-Te, nunca nos portando como Jonas, que achou que poderia deixar de submeter-se às Tuas ordenanças, fugindo e escondendo-se de Ti. Em nome de Jesus. Amém.
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