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AMABILIDADE
Conta uma conhecida fábula que certo dia o sol e o vento discutiam sobre quem era o mais poderoso dos dois, e como não chegavam a nenhuma conclusão, o vento propôs um desafio que, segundo ele, tiraria todas as dúvidas a respeito: “Está vendo aquele homem lá embaixo, vestindo um casaco marrom? Aposto que posso fazê-lo tirar seu agasalho mais rápido que você!” O sol então respeitosamente escondeu-se atrás de uma nuvem para deixar o vento soprar, o que ele fazia com toda a força que podia, quase transformando-se em um vendaval. Mas, quanto mais o vento ventanejava mais o homem apertava seu casaco junto ao corpo, até que o vento por fim desistiu. Foi quando o sol graciosamente surgiu por detrás da nuvem, sorrindo para o homem com bondade e afetuoso calor, o que fez com que ele decidisse, feliz, desvestir seu agasalho. Moral da história: a amabilidade é sempre mais forte que a força bruta, e atitudes amáveis costumam falar mais alto do que somente palavras amáveis.
O comentarista bíblico William Barclay, escreveu que “boas palavras nunca tomarão o lugar de bons atos; e nenhuma quantidade de conversa sobre o amor cristão tomará o lugar de um ato amável para um homem em necessidade, envolvendo certo grau de sacrifício próprio, pois nesse ato o princípio da cruz opera novamente.”
A partir do momento em que Deus nos criou à Sua imagem e semelhança, todos os seres humanos adquiriram a capacidade de exercitar a virtude da amabilidade para ser uma marca distintiva dos Seus Filhos na vida terreal. Enquanto o mundo nos dias de hoje considera que a amabilidade é uma fraqueza, a Palavra de Deus ensina que a amabilidade é uma característica nobre, é a aplicação prática do amor, é a consideração gentil e atenciosa para com as necessidades do próximo, como Paulo explica em 1 Coríntios 13.4-5 (Bíblia Viva): “O amor é muito paciente e bondoso, nunca é invejoso ou ciumento, nunca é presunçoso nem orgulhoso, nunca é arrogante, nem egoísta, nem tampouco rude. O amor não exige que se faça o que ele quer. Não é irritadiço, nem melindroso. Não guarda o rancor e dificilmente notará o mal que outros lhe fazem.”
Por isso tudo a amabilidade é uma qualidade indispensável ao verdadeiro cristão: se Deus trata-nos com amabilidade, apesar de não termos qualquer merecimento, e se almejamos a semelhança com Cristo, devemos agir da mesma maneira com o nosso próximo, atendendo ao que Paulo exorta em Colossenses 3.12 (NVI): “Portanto, como povo escolhido de Deus, santo e amado, revistam-se de profunda compaixão, bondade, humildade, mansidão e paciência.” Em suma, a amabilidade, juntamente com o amor, a alegria, a paz, a paciência, a bondade, a fidelidade, a mansidão e o domínio próprio, compõe o fruto do Espírito, como descrito pelo apóstolo em Gálatas 5.22-23 (NVI), e precisamos nos revestir dela desde o momento em que acordamos pela manhã, da mesma forma como vestimos nossa roupa.
Demonstrar amabilidade a alguém – embora a outra pessoa até pareça não merecer – é fazer o que Cristo faria em nosso lugar, como Ele próprio ensina em Lucas 6.35 (NVI): “Amem, porém, os seus inimigos, façam-lhes o bem e emprestem a eles, sem esperar receber nada de volta. Então, a recompensa que terão será grande e vocês serão filhos do Altíssimo, porque ele é bondoso até para com os ingratos e maus.” A amabilidade é também nossa retribuição ao amor incondicional de Deus, e Paulo em Romanos 12.14 (NVI) diz: “Abençoem aqueles que os perseguem; abençoem, e não os amaldiçoem.”
Atos de amabilidade sempre fazem muita diferença, e as histórias que relatam seu efeito sobre as pessoas são muitas, algumas até mesmo representando a salvação para elas. É o caso verídico de um jovem cristão queniano que estudava na Noruega, e nas férias ia de porta em porta vendendo livros cristãos, quando encontrou um norueguês que, ao abrir a porta de sua casa, de forma pouco amigável, ao ver a cor de sua pele, disse-lhe bruscamente sem rodeios: “Não obrigado, não creio em Deus.” O rapaz então diz que olhou para o homem de maneira inocente, e em seu precário norueguês, pediu: “Por favor me conceda um minuto para lhe dizer o que me trouxe do Quênia para a sua porta.” Ele sabia que muitas pessoas na Noruega não creem em Deus, por isso dessa maneira respondeu ao homem usando sabiamente as palavras, assim seguindo o conselho de Provérbios 15.1,4 (NTLH), o que impactou-o favoravelmente: “A resposta delicada acalma o furor, mas a palavra dura aumenta a raiva. As palavras bondosas nos dão vida nova…”.
As palavras são os principais instrumentos à nossa disposição para demonstrarmos amabilidade – o que nos outorga alta responsabilidade – pois têm a faculdade de afetar nossos interlocutores para o bem ou para o mal, podendo até mesmo a influir no rumo de suas próprias vidas. Ainda um pouco hesitante, o homem deixou o rapaz entrar, e então chegaram até a trocar confidências sobre suas experiências de vida, não demorando muito para o norueguês se interessar pelos livros que o visitante trazia, comprou alguns deles, e por fim até começou a ensinar o estudante a tocar algumas notas no violão!
Agir com amabilidade é um privilégio que Deus nos concede e um dever cristão que nos permite levar a alegria, a paz, a concórdia e a luz de Cristo às pessoas, ao mesmo tempo que nos predispõe à comunhão com o Senhor. Por isso, se somos salvos, se somos verdadeiros crentes, se pertencemos à Sua família, é imprescindível que nos comuniquemos com todos sempre com amabilidade. No Sermão do Monte – na passagem de Mateus 5.43-48 – Jesus nos conclama a sermos perfeitos como perfeito é o nosso Pai celeste, amando nossos inimigos, orando pelos que nos perseguem, usando de amabilidade com os que não nos tratam assim, saudando os que não são nossos irmãos, desta maneira agindo como luminares para este mundo em trevas.
Agora reflitamos com sinceridade por instantes sobre a amabilidade, a benignidade de Deus para conosco. Será que a merecemos? Será algo que o Senhor deve a nós? Será que nossos pensamentos, nossas atitudes, nossas palavras dirigidos aos outros, são tão santos, amáveis e amoráveis, altruístas, elevados, que Ele, por ser justo, não encontra alternativa senão recompensar-nos na mesma moeda? Provavelmente nossa resposta será um redondo não. Mas mesmo sendo como somos, Ele nos ama e trata-nos com uma amabilidade incomparável, de um padrão inalcançável por nossos próprios meios.
Aquela mulher reclamava todos os dias para o marido, olhando pela janela e criticando a falta de capricho e de limpeza da vizinha do lado. Através da vidraça ela via, todas as vezes que a vizinha lavava roupa, a cor de sujeira que elas apresentavam. Até que um dia, ao vigiar as roupas da vizinha, como era seu costume, tomou um susto: as roupas estavam limpas, as brancas branquíssimas, as de cor coloridíssimas, então comentou acidamente com o marido: “Até que enfim a vizinha aprendeu a lavar roupa. Quem será que a ensinou?” Ao que o marido, incontaminado pela falta de amabilidade de sua esposa e sorrindo amavelmente, confidenciou-lhe: “Hoje bem cedo levantei da cama e limpei nossas vidraças…”.
Como este homem tão exemplarmente demonstrou, – e isto especialmente no ambiente doméstico, – uma das formas mais importantes de expressar amabilidade, ao lado de atos de bondade, é pela maneira de nos comunicarmos com as outras pessoas, por isso é através de nosso falar que em boa medida criamos a atmosfera do lar. Se nossas palavras são amáveis e pronunciadas com afeto, geramos um ambiente harmônico e afetuoso, e as pessoas sentirão prazer em estar juntas; mas se, ao contrário, são rudes e ditas com rispidez e desrespeito, o clima doméstico torna-se opressivo, desagradável, dissonante, e os membros da família tenderão ao afastamento uns dos outros e ao isolamento.
Por que às vezes nos falta amabilidade? Há um conjunto de fatores que inibem a sua manifestação: antes de mais nada, é difícil ser amável se não temos a plenitude do Espírito Santo. Ser amável também é uma decisão, tanto quanto amar o é, portanto precisamos querer ser amáveis; por outro lado, se estamos autocentrados em nossos problemas, sem saber como resolvê-los, “de mal” com nós mesmos e com o mundo, nossa “agenda oculta” coloca dificuldades para sermos gentis, pois estaremos irritadiços, pouco sociáveis, “de relações cortadas” com tudo e com todos.
Quando nos sentimos, por alguma razão, inseguros perante outra pessoa, considerando-nos de alguma forma ameaçados, dificilmente seremos amáveis; a amabilidade é também um hábito que algumas pessoas adquirem na infância, geralmente aprendendo com os pais, mas trata-se, igualmente, de uma questão de temperamento pessoal.
A Bíblia demonstra – pelo que revela das vidas de alguns dos heróis da fé – que as pessoas de temperamento sanguíneo, se não estiverem controladas pelo Espírito Santo, têm dificuldade de ser amáveis, como o apóstolo Pedro, irado antes e manso depois de Pentecostes. Os coléricos igualmente desconhecem a amabilidade, até serem cheios do Espírito, como o apóstolo Paulo; já para os melancólicos como Moisés, e em especial para os fleumáticos como Abraão, parece ser mais fácil usarem de amabilidade com os outros. Porém, o mais grave de tudo é que aquele que mão tem domínio próprio abre brechas para que o inimigo de nossas almas tome conta e então seja por ele usado.
Fica claro, no entanto que, seja qual for o nosso temperamento, nossos problemas, nossa formação familiar ou nossos hábitos, somente o Espírito Santo pode nos transformar de pessoas rudes, ríspidas, pouco gentis em pessoas amáveis, corteses e atenciosas. Por isso é essencial termos a plenitude do Espírito para sermos verdadeiramente amáveis sempre, e não apenas socialmente polidos ou gentis – o que geralmente é mais fácil ser em ocasiões esporádicas. A amabilidade deve fazer parte de nossa maneira de ser, da mesma forma como estava profundamente integrada ao caráter do Senhor Jesus – o nosso modelo – e não constituir-se meramente em uma característica “de fachada”, em um simples verniz com o qual tentamos encobrir nosso real perfil, uma máscara que usamos segundo as conveniências do momento. Ela precisa ser uma virtude que estabelece um diferencial claro da nossa presença como cristãos no mundo, “para que venham a tornar-se puros e irrepreensíveis, filhos de Deus inculpáveis no meio de uma geração corrompida e depravada, na qual vocês brilham como estrelas no universo”, como exortou Paulo em Filipenses 2.15 (NVI).
Senhor, Tu que és amor e nos trata com tanta amabilidade, constrange-nos a sermos como Tu. Que todos os nossos atos sejam – dia após dia – expressões de autêntica amabilidade, marcas distintivas que caracterizam os Teus luzeiros, os Teus arautos, os Teus filhos onde quer que estejam. Nunca permita, ó Pai, que o mundo, a nossa carne ou satanás, nos desviem do caminho ascendente que leva a Ti. Em nome de Jesus Cristo oramos e agradecemos. Amém.
3 de junho de 2023
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