ENTREGA TOTAL E IRRESTRITA
O grupo de eminentes botânicos estava escalando aquelas montanhas inóspitas e distantes à procura de novas espécies a serem estudadas quando avistaram uma flor desconhecida em um abismo profundo, na parede de uma estreitíssima ravina. E passaram a ponderar como fazer para chegar até a flor, uma vez que somente alguém de pequena estatura e bem magro poderia ser baixado por uma corda para apanhá-la, e tais condições só eram preenchidas por um menino, filho de um carregador que tinha vindo com o grupo. Então cautelosamente propuseram a ele o desafio. O garoto foi até a beira do buraco, examinou o lugar por vários minutos e disse que ia até o acampamento conversar com seu pai. Passado algum tempo regressou trazendo o pai pela mão e apresentando sua condição para cumprir a tarefa: “Só desço se o meu pai estiver segurando a corda”. Essa historinha mostra que somente quando confiamos de forma absoluta, incondicional, irrestrita, em alguém, conseguimos entregar-lhe algo tão precioso como a nossa vida ou a vida de quem amamos, sem temor, dúvida ou hesitação.
Entregar o nosso caminho, tudo o somos e temos a Deus, portanto, significa confiar nEle sem duvidar, colocando-nos inteiramente sob a Sua augusta, sapientíssima, perfeita, invencível, inabalável proteção. Quando traçamos nossos planos sem antes os entregarmos a Ele, as probabilidades de êxito diminuem imensamente, porque insensatamente deixamos que a nossa tola presunção assuma o controle, e dispensamos a ajuda dAquele que é o Supremo Criador de todas as coisas, inclusive de nós próprios. Trata-se, portanto, de uma soberba, de uma presunção descabida, inaceitável por qualquer ângulo que seja vista, revelando que nos está faltando humildade, sabedoria e sensatez. Assim, os resultados de tal arrogância de nossa parte dificilmente levarão a outro resultado que não seja o fracasso, o desperdício de esforço, de tempo e de esperança. Em suma, tudo o que planejarmos fazer excluindo a participação de Deus, está sujeito a imensos riscos, redundando a maioria das vezes no mais completo e total malogro.
É preciso que jamais nos esqueçamos de que o nosso presente e o nosso futuro pertencem a Deus, estão em Suas Todo-Poderosas mãos, Seus planos são incomparavelmente maiores e melhores que os nossos, portanto, qual a lógica de não confiarmos integralmente nEle, e a Ele então entregarmo-nos e a tudo o que somos e temos?
É como Davi, – que em inúmeras oportunidades teve a sua vida permeada por tantos desafios, lutas, perseguições, traições, – nos exorta no tão conhecido Salmo 37.3-7, passagem da qual fazemos a seguinte paráfrase:
(vv. 3-4) “Dediquemo-nos a tudo colocar sob a guarda de Deus e façamos sempre o que causa alegria e felicidade aos outros, ao longo da nossa jornada terreal nutrindo nosso corpo, alma e espírito somente daquilo que Ele aprova, certos de que, se a nossa vontade estiver alinhada com a dEle, nos concederá o que almeja o nosso coração”.
(vv. 5-6) “Entreguemos inteiramente às Suas mãos a direção da nossa vida, com a inabalável certeza de que Ele cuidará de tudo aquilo que nos é essencial, importante, indispensável , exaltando a nossa vida justa como poderosa luz que dissipa toda treva do mal e a nossa retidão de atitudes com o fulgor incomparável do próprio sol no zênite”.
(v. 7) “Depositemos de forma irrestrita toda a nossa confiança no Senhor, certos de que Ele fará tudo o que é conforme à Sua perfeita verdade eterna, por isso jamais nos indignemos por causa daqueles que enriquecem cometendo toda a sorte de corrupção e maldade”.
Descansar no Senhor é a nossa tarefa mais importante, que devemos exercitar diariamente, atendendo ao que o Senhor Jesus ensinou no Sermão do Monte, na passagem que está em Mateus 6.25-34, estimulando-nos a não nos preocuparmos e muito menos a nos angustiarmos: “Por isso, vos digo: não andeis ansiosos pela vossa vida, quanto ao que haveis de comer ou beber; nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a vida mais do que o alimento, e o corpo, mais do que as vestes? Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros; contudo, vosso Pai celeste as sustenta. Porventura, não valeis vós muito mais do que as aves? Qual de vós, por ansioso que esteja, pode acrescentar um côvado ao curso da sua vida? E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo: eles não trabalham, nem fiam. Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qualquer deles. Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé? Portanto, não vos inquieteis, dizendo: Que comeremos? Que beberemos? Ou: Com que nos vestiremos? Porque os gentios é que procuram todas estas coisas; pois vosso Pai celeste sabe que necessitais de todas elas; buscai, pois, em primeiro lugar, o seu reino e a sua justiça, e todas estas coisas vos serão acrescentadas. Portanto, não vos inquieteis com o dia de amanhã, pois o amanhã trará os seus cuidados; basta ao dia o seu próprio mal”.
Há coisas que somente Deus pode nos conceder, por isso entregar nossas carências, nossas causas, nossos temores a Ele, é sábio, é o que de mais sensato podemos fazer, sob pena de até chegarmos a ver afetada a nossa saúde física, mental, emocional e até espiritual, comprometendo a produtividade das nossas atividades, tornando-nos irritadiços e mal humorados. E esta é a diferença crucial entre a preocupação e a angústia: enquanto a preocupação deve idealmente nos mover à ação, a angústia quase sempre nos paralisa e derrota, porém ambas competem com a nossa entrega de tudo a Deus, sobrecarregando-nos muitas vezes indevidamente, principalmente quando agimos daquela forma tão conhecida de apenas teoricamente entregarmos nosso caso ao Senhor, porém sem soltá-lo completamente de nossas próprias mãos.
Além disso, as tribulações que nos atingem por vezes tendem a solapar a nossa confiança em Deus, colocando-nos naquele grupo de homens de pequena fé que Jesus repreende em vários momentos de Seu ministério terreal, como em Mateus 6.30 com relação à ansiedade: “Ora, se Deus veste assim a erva do campo, que hoje existe e amanhã é lançada no forno, quanto mais a vós outros, homens de pequena fé?”; com relação à falta de fé, em Mateus 8.26: “Perguntou-lhes, então, Jesus: Por que sois tímidos, homens de pequena fé? E, levantando-se, repreendeu os ventos e o mar; e fez-se grande bonança”; quanto à falta de confiança nEle, em Mateus 14.31: “E, prontamente, Jesus, estendendo a mão, tomou-o e lhe disse: Homem de pequena fé, por que duvidaste?”; pouco antes de realizar a primeira multiplicação de pães e peixes, repreendendo-os quanto à falta de fé no Seu poder miraculoso, em Mateus 16.8: “Percebendo-o Jesus, disse: Por que discorreis entre vós, homens de pequena fé, sobre o não terdes pão?”. Contudo, é principalmente em circunstâncias desafiadoras, quando nos sentimos totalmente impotentes para vencer as barreiras que surgem à nossa frente, quando a fraqueza toma conta de nós e a dor, a desesperança e a falta de discernimento nos deixam confusos, inseguros, que a única esperança, o único caminho que nos resta é, pela fé, entregarmos nosso motivo de forma total e irrestrita nas mãos do Único que pode nos salvar, apontando a saída para a crise que nos assola.
É então que urge entregar nosso caminho a Ele, e aqui vale a pena relembrarmos o que Davi nos aconselha, do alto de sua imensa experiência no enfrentamento dos gigantes do sofrimento, no Salmo 37.5: “Entrega o teu caminho ao SENHOR, confia nele, e o mais ele fará”. Simples assim, colocarmos a nossa vontade, os nossos planos, a nossa parca capacidade, nas mãos poderosas de Deus e nEle descansarmos, com a certeza de que Ele tudo fará!
Chega de sermos enganados pelas ardilosas vozes do mundo que jaz no maligno, falsamente nos querendo fazer crer que tudo podemos, que não precisamos de Deus, que basta fazermos isso ou aquilo e o sucesso será nosso! Quanto engodo irresponsável e cruel que leva muita gente a viver de ilusões, de mentiras e de falsas certezas de que sós podem alguma coisa! E há até igrejas que inoculam nas mentes de seus adeptos que é preciso “determinar” que certos desejos sejam atendidos, como se tivéssemos a capacidade de dizer a Deus o que deve fazer por nós!
Nossa única esperança na vida reside em Deus, por isso é preciso enfrentar e contrariar duramente a nossa pretensa autossuficiência, vaidade exacerbada e poder irreal, frutos da nossa tendência de superestimar a nós mesmos e de subestimar ao próximo. É o oposto da atitude de Davi, rei poderoso, porém humilde, obediente e que tudo entregava nas poderosas mãos do Senhor, e é assim que Paulo em Atos 13.22 relata que Deus confirmou ao profeta Samuel que ele era o Seu escolhido e então “… disse: Achei Davi, filho de Jessé, homem segundo o meu coração, que fará toda a minha vontade”. Isso não significa que nada podemos fazer , decidir ou almejar, porém temos que lembrar do que Paulo afirmou em Filipenses 4.13: “… tudo posso naquele que me fortalece”, ou seja, o poder que recebemos em nossa união com Cristo é suficiente para enfrentarmos os desafios que surgem, ou seja, podemos carecer de tudo e, ao mesmo tempo, possuir tudo, pois se caminhamos com Cristo e vivemos nEle, estamos prontos a enfrentar qualquer desafio.
E a singeleza, humildade, reverência e entrega a Deus que Davi cultivou ao longo de toda a sua existência, fica evidente em tudo o que compôs, como no Salmo 131.1-2, quando confessa com humilde confiança que: “SENHOR, não é soberbo o meu coração, nem altivo o meu olhar; não ando à procura de grandes coisas, nem de coisas maravilhosas demais para mim. Pelo contrário, fiz calar e sossegar a minha alma; como a criança desmamada se aquieta nos braços de sua mãe, como essa criança é a minha alma para comigo”. Que maravilhosa demonstração de entrega total nas mãos de Deus, confessando que não almejava nada alto nem grande, sentindo-se extraordinariamente confortável e abençoado por toda a graça divina de que era objeto!
O profeta Jeremias em seu livro, capítulo 17.7-8 dá-nos outro exemplo de postura confiante e inabalável no Deus Todo-Poderoso ao afirmar: “Eu sei, ó SENHOR, que não cabe ao homem determinar o seu caminho, nem ao que caminha o dirigir os seus passos. Bendito o homem que confia no SENHOR e cuja esperança é o SENHOR. Porque ele é como a árvore plantada junto às águas, que estende as suas raízes para o ribeiro e não receia quando vem o calor, mas a sua folha fica verde; e, no ano de sequidão, não se perturba, nem deixa de dar fruto”.
Entregar tudo a Deus, portanto, é confiar de forma irrestrita, total e absoluta nEle, deixando de fazer escolhas pessoais e de tomar decisões sem o concurso do nosso Criador, ao contrário, permitindo que Ele cuide de tudo, conduza tudo, assuma tudo em nossa vida, e para isso é importante:
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Estudar a Palavra de Deus consistentemente, sem cessar, porque ela é a fonte de todo o saber, de todo o conhecimento do Senhor, e quanto mais O conhecermos, mais confiaremos nEle;
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Orar todos os dias para que Ele assuma integralmente a nossa vida e fale ao nosso coração, guiando-nos, corrigindo-nos e abençoando-nos, para que tudo o que fizermos emane dEle e, portanto, esteja sempre conforme a Sua vontade perfeita e soberana.
Pai Eterno, ensina-nos a entregar toda a nossa vida, em todos os momentos e circunstâncias, em Tuas amorosas, poderosas, invencíveis mãos, firmemente confiados de que tens o controle de tudo. E que jamais temamos o que quer que seja que se nos anteponha em nossa jornada na terra, pela certeza de que estamos totalmente entregues em Tuas mãos transbordantes de amor, graça e misericórdia por nós que somos Teus filhos amados. Confiamos em Ti, Senhor, e sabemos que És fiel, portanto jamais nos abandonarás à nossa própria sorte, ao contrário, pois a nossa fé em Ti é inabalável como canta o autor do Salmo 125.1: “Os que confiam no Senhor são como o monte Sião, que não se abala, firme para sempre”. É no nome santo, precioso, que está acima de todo nome que oramos para sempre profundamente agradecidos. Amém.
6 de maio de 2023
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