Dia e Noite

Dia e Noite

Logo de manhã o rapaz sentou na margem do rio e deixou-se ficar por todo o dia contemplando as águas. Escureceu, a noite caiu, ele estirou-se sobre a grama e acabou dormindo ali mesmo. Ao romper do dia seguinte, um homem que morava nas proximidades e que havia observado aquele estranho comportamento, foi até o rapaz e perguntou: “Notei que desde ontem de manhã você está sentado aqui na beira do rio. Posso ajudar em alguma coisa?” Um pouco surpreso com a inesperada aparição daquele homem, a rapaz redargüiu: “Não, obrigado, estou só esperando que o rio acabe de passar para que eu consiga atravessar para o outro lado e assim poder resgatar um irmão que precisa vir para cá e não consegue!” Parece cômico, mas o comportamento de muitos crentes parece se assemelhar ao do rapaz, só que ao invés do rio, estão esperando que o tempo passe, confortavelmente sentados na “platéia” da igreja, “assistindo” ao culto como quem vai a um teatro, cogitando em talvez um dia – quem sabe – assumir uma posição ativa na comunidade dos santos. É claro que esta postura passiva é muito confortável, tranqüila e agradável, e não há dúvida de que louvar a Deus, adorá-lO em comunhão como os irmãos é maravilhoso e essencial na vida do crente e da igreja. Porém Deus espera de nós que além do louvor e da adoração tenhamos uma atitude participativa na Sua obra, que sejamos cooperadores Seus na construção do Reino.

Em João 9.4 Jesus disse: “É necessário que façamos as obras daquele que me enviou, enquanto é dia; a noite vem, quando ninguém pode trabalhar.” O dia – quando há condições para trabalhar porque existe luz – passa célere, e então vem a noite, quando as condições para desempenharmos nossa função de colaboradores do Pai são impraticáveis. Muitas foram as obras que Deus comissionou a Seu Filho, e que Ele obediente se submeteu a realizar. John Gill, o grande estudioso da Bíblia, em seus comentários sobre o livro de João, diz que quando Jesus afirma que é preciso realizá-las enquanto é dia, é porque de dia há vida, e na noite da morte não há trabalho.  Nossa vida é curta, dura apenas o tempo da luz do dia – nas palavras de Jó, é “Tal como a nuvem se desfaz e passa…” – uma grande variedade de assuntos devem ser tratados e realizados, e a morte se aproxima, quando então porá um fim a toda a possibilidade de trabalho. E aí quem sabe muitos que estão do outro lado do mundo, do país, da cidade, do bairro, da rua, ou simplesmente do corredor do edifício em que moramos – precisando desesperadamente ser resgatados pela Palavra da Verdade – fiquem por lá porque nós não tivemos a iniciativa de ir até eles em tempo hábil. Lembremo-nos de que a graça de Deus nos basta, mas se a retivermos egoisticamente, não estaremos dando os frutos que o Senhor espera de nós por termos recebido tão grande dádiva, e assim deixamos de obedecer o que Ele ordena em Eclesiastes 11.2: “Reparte com sete e ainda com oito, porque não sabes que mal sobrevirá à terra.”

O gigante da fé, George Müller (1805-1898), nasceu na Alemanha, converteu-se com a idade de 24 anos, depois foi para a Inglaterra, onde serviu ao Senhor pelo resto de sua vida. Em 1830, três semanas após seu casamento, ele e sua esposa decidiram abrir mão de seu salário como pastor de uma pequena congregação, e passaram a depender exclusivamente de Deus para o atendimento de suas necessidades. Resolveram também nunca revelar suas necessidades às pessoas, nunca pedir dinheiro a ninguém – a não ser a Deus – nunca contrair dívida por motivo algum, e não poupar nem guardar dinheiro. Durante mais de sessenta anos de ministério, Müller fundou 117 escolas que educaram mais de 120.000 jovens e órfãos, distribuiu 275.000 Bíblias completas em diferentes idiomas, sustentou 189 missionários em outros países, e sua equipe de assistentes chegou a contar com 112 pessoas.
Não estamos querendo insinuar que todos os crentes devem agir da mesma maneira, até porque Deus tem um plano especial para cada um de Seus filhos, e este era o plano exclusivo que tinha para George Müller. Mas ele obedeceu ao ide do Senhor, a Ele entregou-se completamente, e mercê de Sua graça e poder, cooperou para a construção de uma parcela marcante da obra divina. O que queremos dizer é que devemos orar a Deus pedindo para que Ele esteja sempre no controle de nossas ações e atitudes, revelando qual é o Seu plano específico para nós e de que forma quer que cooperemos com Ele, como Paulo em 1 Coríntios 3.9 nos lembra: “Porque de Deus somos cooperadores; lavoura de Deus, edifício de Deus sois vós”. Müller foi um homem de fé inabalável, e por isso um cooperador de Deus verdadeiramente assemelhado a Cristo, portanto exemplo e inspiração para todos nós.

Certa vez perguntaram a George Müller qual era o segredo do sucesso de seu ministério, e sua pronta resposta foi: “O segredo é que George Müller morreu já há alguns anos atrás”. É necessário que nos conscientizemos que se não morrermos para o nosso próprio ego e para suas concupiscências, como Paulo instruiu em Colossenses 3.5, “Fazei, pois, morrer a vossa natureza terrena…”, Cristo jamais poderá reinar plenamente em nós. É preciso sempre ter em mente que Deus é infinitamente maior do que nós, que Cristo deve ser o centro de nossa vida, e reafirmar dia e noite que a razão última de existirmos é a glória de Deus, nunca a nossa própria.

Soberano Deus e amado Pai, Tu sabes que como cristãos, temos uma forte tendência de nos incluir nas bênçãos prometidas no Evangelho, mas de nos excluir de sua aplicação, de sua prática, pretendendo ver a terra arada sem que coloquemos as mãos no arado. É em nome de Jesus que suplicamos pela Tua direção e força para que nos ponhamos a campo para cooperar decididamente, ousadamente, conTigo. Amém.