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FRUTIFICAÇÃO

Ano após ano aquela vinha frustrara as expectativas do agricultor, produzindo poucas uvas, embora ele a cultivasse com todos os cuidados e adotando as técnicas corretas. Até que inesperadamente, a partir de determinado ano, a produção foi grandiosa, extraordinária, e a colheita rendeu grande quantidade de belos cachos de uvas. Intrigado, o viticultor começou a investigar pelo vinhedo e descobriu que as raízes das plantas haviam seguido por baixo da terra, na direção de um córrego próximo, em busca da abençoada água de que carecia, ilustrada pela figura registrada em Ezequiel 17.8: “Em boa terra, à borda de muitas águas, estava ela plantada, para produzir ramos, e dar frutos, e ser excelente videira”. É assim também conosco: se estamos com Cristo, bebendo da fonte de água viva, produziremos frutos em abundância, enquanto que apartados dEle, nada conseguiremos, pois é impossível bem frutificar afastado de Deus.

 

Jesus afirmou em João 15.1: “Eu sou a videira verdadeira, e meu Pai é o agricultor.” Deus plantou no mundo seu Filho unigênito Jesus, a pedra angular eleita e preciosa, o alicerce da nova igreja, uma videira destinada a produzir muito fruto para a Sua glória, para ser tudo aquilo que Israel deveria ter sido no passado e recusou-se a ser.

 

E qual é o fruto através do qual Deus deve ser glorificado pela videira verdadeira, Jesus Cristo, e por seus ramos, nós? Vários textos do Novo Testamento referem-se à figura do fruto de maneiras diversas: em Gálatas 5.22, é o fruto do Espírito, Efésios 5.9 fala do fruto da luz, Hebreus 13.15, ressalta o fruto dos lábios. Porém é preciso considerar também o significado de fruto como produto de um empreendimento realizado com um determinado fim, neste caso aquilo por meio do que glorificamos a Deus, representado pela reprodução da mesma vida presente na planta, ou seja, pelas uvas da videira: são estas as pessoas conquistadas pelo nosso serviço como discípulos  de Cristo e plenificadas de vida divina, que por sua vez deverão dar sequência à multiplicação do fruto.

 

Mas Jesus faz uma séria advertência, seguida de uma promessa em João 15.2, referindo-se ao Pai: “Todo ramo que, estando em mim, não der fruto, ele o corta; e todo o que dá fruto limpa, para que produza mais fruto ainda.” O original grego do texto deixa claro, no entanto, que a ausência de fruto do ramo deve provir de uma vontade deliberada de não frutificar, referindo-se assim a todo aquele que não estiver disposto a dar fruto, e que por isso será objeto de juízo, e vale tanto para um crente quanto para uma comunidade eclesial. Afinal, qual a razão de um ramo estar na videira, pertencer a ela, usufruindo de todo o bem, de toda a vida que ela graciosamente concede, se não for para trazer frutos para Deus, que é a razão mesma de sua existência, optando ao contrário por viver egoisticamente apenas para si próprio?

 

A promessa que sucede a advertência é maravilhosa: o direito de ser limpo é concedido para alguém ser mais produtivo mais para o Reino de Deus, para ser um servo mais útil. O ramo, quando autêntico, verdadeiro, assim o deseja, e anseia profundamente participar mais e mais da Obra do Pai, pois sabe que produzir frutos não é um fardo, mas uma alegria, uma bênção, um privilégio, uma realização que justifica sua própria existência, que sintetiza a finalidade mesma de ter sido criado por Deus! Mas gerar frutos só é possível quando o ramo recebe sem obstáculos o fluir essencial da seiva que conduz a sua força vital, por isso é necessário ser limpo pelo Supremo Viticultor, o único que pode fazê-lo de forma apropriada, removendo tudo o que possa impedir o fluir do nosso serviço como Ele deseja, e que por consequência reduz drasticamente nossa produção: egoísmo, inércia, influências mundanas, idolatria e prioridades equivocadas estão entre alguns dos impedimentos.

 

Aos Seus discípulos de ontem e de sempre, Jesus acrescenta, em João 15.3: “Vós já estais limpos por causa da palavra que vos tenho falado.” Será que nós podemos nos considerar limpos pela Palavra? Observemos que em João 13.3-11 – passagem que narra a parábola da lavagem dos pés dos discípulos por Jesus – está implícito que mesmo os “lavados”, ainda que transitória e completamente limpos, necessitam constantemente de reiterados lava-pés por meio da Palavra, para continuar produzindo mais fruto ainda.

 

Geralmente identificamos este ato de limpar com o sofrimento, com a provação, mas sabemos que somente o sofrimento não purifica. É indispensável que a Palavra esteja presente em todos os momentos desta ação continuada, para que sejamos depurados e nos voltemos profundamente para Deus, do contrário há boas chances de que nos tornemos amargurados, e tenhamos nossos corações endurecidos. E mesmo que haja ausência de dor no processo de limpeza, a Palavra, por sua força penetrante, depuradora e direcionadora, é indispensável.

 

Todavia, nosso Senhor nos aponta um aspecto definitivo, fundamental, sine qua non para estarmos aptos a produzir frutos, em João 15.4: “Permanecei em mim, e eu permanecerei em vós. Como não pode o ramo produzir fruto de si mesmo, se não permanecer na videira, assim, nem vós o podeis dar, se não permanecerdes em mim.” O ramo, na verdade, é uma espécie de condutor, de suporte do fruto, mas ele não tem a capacidade de gerá-lo por si próprio. Somente se continuar organicamente unido à videira para receber ininterruptamente o fluir da divina seiva, poderá dar à luz o fruto, por isso o Mestre exorta para permanecermos nEle.

 

É patético como tantas vezes nos esquecemos desta questão crucial, e nos lamentamos e nos cobramos por nossa infertilidade, tentando superá-la unicamente com nossos humanos e parcos esforços sendo, um após outro, seguidamente baldados! A partir desta constatação, jamais nos esqueçamos: por nós mesmos nunca seremos capazes de produzir bons e duradouros frutos que glorifiquem o Pai. Entretanto, ao contrário da natureza, onde o ramo da videira só deixa de continuar ligado à videira caso seja separado pela força, nós só permaneceremos em Jesus Cristo se desta maneira decidirmos livremente por nossa própria vontade e responsabilidade obedecer aos Seus mandamentos.

 

John Stott em sua obra A Bíblia Toda, O Ano Todo, cita o bispo J. C. Ryle da Igreja da Inglaterra, que certa vez disse que devemos ouvir a maravilhosa, abençoada, amorosa, paternal exortação que Jesus está nos fazendo: “Permaneçam em mim. Agarrem-se a mim. Colem-se firmemente em mim. Vivam a vida de comunhão íntima comigo. Cheguem cada vez mais perto. Passem todo o fardo para mim. Lancem todo o peso sobre mim. Nunca se soltem de mim nem por um momento sequer”.

 

A importância desta questão essencial, que deve caracterizar a vida de um verdadeiro discípulo de Jesus é tão grande, que Ele a reitera em João 15.5: “Eu sou a videira, vós, os ramos. Quem permanece em mim, e eu, nele, esse dá muito fruto, porque sem mim nada podeis fazer.” Precisamos ter sempre a clara consciência de que fomos escolhidos, eleitos de acordo com o plano soberano de Deus para um propósito Seu, maravilhosos privilégio e obrigação que nos foram outorgados para que possamos estar permanentemente unidos a Ele, 24 horas por dia, e não apenas por alguns minutos de devoção, para que demos muitos frutos. E não há alternativa, plano B ou outro caminho, nos assegura o Senhor. Separados dEle, como discípulos ou comunidades eclesiais isolados, nada conseguiremos que seja permanente e que glorifique o Pai. Jesus não é – como imaginam alguns – uma espécie de posto de abastecimento de combustível para onde nos dirigimos quando nos sentimos faltos de algo que sabemos só Ele pode nos conceder, para depois de atendidos voltarmos a viver de forma autônoma e autossuficiente, até o percalço seguinte, e assim sucessivamente.

 

Muitos cristãos imaginam que dar frutos significa somente ganhar almas para Cristo, ou cumprir as obrigações na igreja, mas as Escrituras mostram que não é só isso. Evangelizar é muito importante, porém o Antigo Testamento ensina que os frutos da videira divina são a justiça e a retidão, enquanto que o Novo Testamento aponta que o fruto do Espírito é nos assemelharmos a Cristo, e sermos plenos de amor, alegria, paz, longanimidade, benignidade, bondade, fidelidade, mansidão e domínio próprio!

 

Pai Amado, almejamos profundamente ser ramos frutíferos da videira verdadeira. Por isso entregamos nossa vida a Ti, o Supremo Agricultor, e confiamos em Ti, cientes de que Tua primeira ação é a poda – representada pela provação e pelo conhecimento da Palavra que geram a limpeza indispensável à santificação – que Tu promoves para que frutifiquemos mais abundantemente. Sabemos também que é responsabilidade principalmente nossa estar em Cristo, permanecer nEle, orgânica e estreitamente unidos a Ele, e que só assim teremos um relacionamento recíproco, pois se permanecermos nEle, permitindo que seja nosso Senhor e doador da vida, Ele também permanecerá em nós. No Seu nome bendito oramos e agradecemos. Amém.

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